Muitos de nós valorizam mais os resultados do que os processos, especialmente quando se trata de um processo que leva tempo. E certamente em nada nos ajuda o fato de a tecnologia ter tornado essa espera algo opcional em muitos casos, como nos mostram as respostas de IA eficientes e as entregas da Amazon no mesmo dia da compra. Nossa cultura da gratificação instantânea menospreza as práticas tediosas, o crescimento lento e o desenvolvimento a longo prazo. Queremos aquilo que desejamos, e queremos já, agora.
A expressão “tempo é dinheiro” não é bíblica, mas, mesmo na igreja, nós abraçamos esse slogan e batizamos o Evangelho como Evangelho da eficiência. Essa mentalidade reconfigurou não apenas a forma como vemos o dinheiro, mas também como entendemos Deus e a vida cristã. Em uma cultura que eleva a eficiência, a produtividade e a conveniência acima de tudo, valores como o florescimento do ser humano e a profundidade relacional são suplantados por expectativas cada vez mais irreais, por isolamento, exaustão e descontentamento, nessa eterna busca por alcançar mais e por ser mais. Em tudo isso, operamos sob a influência do pressuposto tácito de que fomos feitos para fazer tudo: que somos ou que deveríamos ser infinitos — uma qualidade que só Deus possui.
Com demasiada frequência, a igreja tenta resolver o problema das obrigações sem fim da mesma forma que o mundo — buscando aprimorar nossas habilidades de gestão do tempo: acordar mais cedo, ser mais disciplinado, adotar os últimos avanços tecnológicos que prometem maior otimização do tempo. Mas nossa ênfase na rapidez pode nos levar a uma compreensão equivocada de Deus e de como ele opera, o que inevitavelmente significa que acabamos por interpretar mal a nós mesmos.
Em outras palavras, e se o nosso problema fundamental não for de natureza prática, mas sim teológica?
O Deus das Escrituras claramente tem uma hierarquia de valores diferente da nossa. Ele é paciente, ponderado e fiel. Ele se sente confortável em fazer as coisas em seu próprio tempo, visto que seu maior valor não é a eficiência, mas sim o amor. Precisamos conectar nossa teologia (nossa visão de Deus) com a nossa antropologia (nossa visão do ser humano) e deixar que os valores de Deus moldem os nossos, em vez de projetar os nossos valores sobre ele.
Os cristãos sempre acreditaram que Deus não é uma divindade regional ou tribal, mas sim o Criador do céu e da terra. Assim, os teólogos frequentemente falam da independência de Deus: que somente Deus é autoexistente e autodeterminado, e todas as criaturas — incluindo nós mesmos — dependem necessariamente dele. Este é o cerne da distinção entre Criador e criatura.
Embora dependência seja, em grande parte, uma palavra negativa na cultura ocidental, é um termo positivo na teologia cristã. Parte do bem existente em nossa criação reside no fato de termos sido feitos para depender de Deus, do próximo e do restante da criação. Deitrich Bonhoeffer argumentou que, embora o pecado possa distorcê-las, essas dependências não são resultado da Queda, mas sim um reflexo do desígnio original de Deus. O homem que se faz na vida sozinho é um mito; afinal, todo mundo tem um umbigo [um sinal de que já dependeu de alguém]! Dependemos dos outros de inúmeras maneiras, e nossos limites nos levam a Deus, aos outros e ao próprio planeta Terra. Era intenção de Deus que as criaturas humanas crescessem em saudável dependência.
Em seu livro God’s Provision, Humanity’s Need [A provisão de Deus, a necessidade da humanidade], a teóloga Christa L. McKirland descreve o conceito de “necessidade fundamental”, segundo o qual as características de uma criatura determinam suas necessidades. Quando essas necessidades são atendidas, a criatura prospera; quando lhe são negadas, a criatura sofre. “Uma rosa precisa da luz do sol para florescer porque é uma planta. Uma baleia precisa de plâncton para florescer porque é um animal”, escreve ela, e “os seres humanos precisam de uma relação pessoal com Deus”.
Essa é uma maneira mais elegante de dizer que fomos projetados para nos relacionar com Deus de forma bidirecional. No século 17, o teólogo John Owen chamou a isso de “comunhão” e a definiu como “relações mútuas”, o que significa que fomos feitos para um engajamento pessoal com Deus. Sem essa interação, a criatura humana definha, enquanto uma melhora nessa relação — tanto em termos de quantidade quanto de qualidade — resulta em uma vida humana mais plena.
Para florescer verdadeiramente, o ser humano precisa não apenas de água ou de alimento, de oxigênio ou da companhia de outros seres humanos, mas também da comunhão ativa com Deus.
Nosso relacionamento com Deus, no entanto, raramente é pautado pela eficiência. Muitas vezes parece lento e até inconveniente. Por exemplo, quando Deus estende sua graça à nossa vida fragmentada e carente, por que ele não nos liberta imediatamente dos nossos defeitos? Por que nossos maus hábitos não são apagados e virtudes positivas não são produzidas instantaneamente em nós? Se Deus não gosta de certas atitudes e comportamentos, por que o Todo-Poderoso não nos transforma de uma vez, para que nunca mais falhemos?
Nós, cristãos, sentimos culpa e vergonha não apenas em nossa luta contínua contra o pecado, mas também em relação às nossas limitações humanas. Sempre que deixamos de priorizar nosso relacionamento com Deus ou sempre que não temos energia para fazer tudo o que achamos que precisa ser feito, sentimos que deveríamos aprender mais, fazer mais, ser mais — sempre mais. E porque tantas vezes falhamos em atingir o ideal divino, nós nos perguntamos se Deus não está constantemente decepcionado ou talvez até mesmo zangado conosco.
Mas, e se Deus valorizar não apenas o resultado, mas também o processo do nosso crescimento e o trabalho envolvido nele? Veja bem, o maior valor para Deus não é a eficiência, especialmente não em um sentido simplista ou mecanicista. O maior valor para Deus é o amor.
E o amor muitas vezes entra em conflito com nossas noções de eficiência. Uma das coisas mais ineficientes que você pode fazer nesta vida é amar outro ser vivo. Amar outra criatura requer energia, flexibilidade e muita, muita paciência. Mas o Criador Todo-Poderoso sempre priorizou o amor e o crescimento saudável, em vez de uma eficiência mecanicista. Como lemos em 2Pedro:
Amados, não se esqueçam disto: um dia com o Senhor é como mil anos, e mil anos, como um dia. O Senhor não demora em cumprir a sua promessa, como alguns julgam. Ao contrário, ele é paciente com vocês e não quer que ninguém pereça, mas que todos cheguem ao arrependimento. (3.8-9)
Deus está mais interessado em relacionamentos do que na velocidade do nosso progresso; ele está mais preocupado em elevar o nosso olhar, em instigar o nosso cântico e em estimular nossa imaginação com sua bondade e glória do que simplesmente nos levar à linha de chegada. E, como a maioria dos artistas ou dos autores bem sabe, a eficiência mecanicista costuma ser inimiga da criatividade.
Não teria sido muito mais eficiente se Deus tivesse criado o mundo inteiro em tons de preto, branco e cinza? Por que essa extravagância das penas de um pavão, a complexidade da orquídea, as sutilezas da voz humana, a transcendência de um orgasmo dentro da relação conjugal? Será que era realmente necessário termos tantas cores, tanta diversidade, tanta profundidade e tanto encantamento no mundo?
Alguém com a mentalidade industrial moderna poderia acusar nosso Criador de ser indulgente, perdulário e até mesmo exagerado. Mas Deus não é descuidado nem negligente; ao contrário, ele tem propósito e sabedoria, é paciente e intencional em todas as coisas.
O Deus que criou o cosmo valorizou o processo pelo qual o fez. Em vez de simplesmente estalar os dedos, Deus proferiu sua Palavra, e seu Espírito se moveu sobre as águas turbulentas para trazer ordem ao vazio (Gênesis 1.2-3). Ele levou seis dias para criar tudo o que existe — sejam eles dias de 24 horas ou não. Deus poderia ter criado tudo instantaneamente, mas Gênesis o descreve como alguém que faz as coisas em seu tempo e, depois, descansa. Esse processo, que alguns podem considerar ineficiente, foi considerado “bom” [por Deus] (Gênesis 1.10, 25).
Em vez de eficiência, Deus está interessado em cultivar amor, beleza, maravilhamento, comunidade e adoração. Às vezes, ele é rápido em sua obra — transformando água em vinho instantaneamente ou ressuscitando os mortos. Mas Deus com frequência opta por caminhos mais lentos, que envolvam o seu povo no processo: o êxodo levou décadas, exigiu fé e amadurecimento do povo hebreu (Êxodo 23.30).
Como pai, eu gostava de ver meus filhos pequenos aprendendo e crescendo, à medida que desenvolviam novas habilidades e competências — mesmo quando esse processo envolvia falhas, quedas ou um pouco de bagunça. Em contraste, tendemos a ter uma opinião muito ruim sobre nosso Pai celestial em situações semelhantes, embora talvez nunca admitamos isso. Parecemos acreditar que Deus espera que sejamos instantaneamente perfeitos, sem falhas, que nunca cometamos erros nem fracassemos. Achar que ele valoriza apenas eficiência e produtividade mostra que não entendemos a maneira como ele responde às nossas necessidades.
Esquecemos que o projeto original do Criador incluía limitações e dependência — e que a sua ternura por nós só aumenta com a nossa profunda necessidade dele. O mesmo Espírito da criação é o Espírito da santificação; Deus opera em nós ao longo de toda a nossa vida, não apenas no momento da nossa conversão. Crescemos espiritualmente cultivando lentamente o nosso deleite em Deus, no próximo e no restante da criação (Gênesis 2.15; Mateus 22.37-39). Deus valoriza o processo, e não apenas o produto final (Tiago 1.4).
Como observa o professor e autor Leopoldo A. Sánchez M., nossa resposta, como criaturas, à obra santificadora de Deus em nós envolve “uma alegre submissão às mãos do Espírito que nos esculpe”. Tal dependência pode ser alegre porque nosso Criador não espera que sejamos deuses; em vez disso, ele pede que confiemos nele e dependamos dele, como o nosso Deus. Negligenciar nossas realidades como criaturas pode produzir timidez, em vez de confiança; medo, em vez de esperança; e exaustão, em vez de descanso.
Sempre que falhamos — seja por causa do pecado, seja simplesmente por sermos criaturas com capacidades limitadas — faz muito bem à alma lembrar que nossa fé não se baseia em nosso próprio poder ou em nossa plenitude, mas sim no fato de que Deus é digno de confiança.
Produtividade e eficiência não são metas ruins, mas podem ser destrutivas, quando as aplicamos a seres humanos como se fôssemos meras máquinas complexas. Seres humanos não precisam apenas ser recarregados ou atendidos; fomos criados para dormir, comer, festejar, rir e viver em relacionamento com Deus e uns com os outros.
Oliver Burkeman, em seu inspirador livro Four Thousand Weeks: Time Management for Mortals [Quatro mil semanas: gestão de tempo para meros mortais], descreve o problema em nível prático:
A cultura da conveniência nos seduz a imaginar que podemos encontrar espaço para tudo o que é importante, eliminando apenas as tarefas tediosas da vida. Mas isso é mentira. Você precisa escolher algumas coisas, sacrificar todo o resto e lidar com a inevitável sensação de perda que disso resulta.
Será que realmente acreditamos nisso? Com excessiva frequência, imaginamos que, se simplesmente nos tornarmos mais rápidos, se tomarmos decisões melhores e se nos organizarmos melhor, poderemos, então, alcançar todos os nossos objetivos. Essas crenças muitas vezes permanecem ativas bem no fundo da nossa mente, gerando um descontentamento que tem raízes profundas.
Esse impulso mecanicista por uma produtividade cada vez maior, pela máxima eficiência e pela conveniência pessoal age como uma lixa em nossa alma. Em vez dessas coisas, ansiamos por reservar um tempo para intimidade, pertencimento e dependência saudável. Sim, a preguiça e a negligência podem ser dolorosas e destrutivas para o florescimento do ser humano, mas as demandas implacáveis pela maximização da produtividade também o são.
Nosso Criador não é preguiçoso nem é tirânico. Em vez disso, ele é sábio, compassivo e determinado em seus própósitos — e é isso que deve moldar a nossa visão de fidelidade. O Deus que se sentiu confortável em dedicar tempo ao seu processo original de criação é o mesmo Deus que se sente confortável em realizar em nós, ao longo do tempo, a boa obra de sua nova criação. Com gentileza, mas com confiança, devemos nos lembrar de que “aquele que começou a boa obra em vocês há de completá‑la” (Filipenses 1.6).
Deus não nos promete mudanças nem vitórias instantâneas; ele promete que está trabalhando, que não nos deixará e que tem uma visão que enxerga mais longe do que a nossa. Que sua paciência e sua perspectiva nos dêem a coragem de que precisamos para este dia, este mês e esta vida.
Kelly M. Kapic é professor de estudos teológicos no Covenant College, em Lookout Mountain, Geórgia. Ele é autor ou editor de mais de 15 livros, entre eles You’re Only Human [Você é apenas um ser humano] e Embodied Hope [Esperança encarnada], ambos vencedores do Christianity Today Book Award.
The post Desaprendendo o Evangelho da eficiência appeared first on Christianity Today em português | Cristianismo Hoje.