1.3. O Deus Perdoador
Pela graça conhecemos a Deus! Ele se deu a conhecer fidedigna e adequadamente à nossa compreensão. Aliás, sabemos isso porque Ele mesmo se declara assim de modo compreensivo a nós.
Qual atributo mais ressaltamos em nossas meditações?
Meditar sobre os atributos de Deus é um grande e abençoador privilégio. No entanto, determinados atributos tornam-se subjetivamente mais relevantes para nós em circunstâncias especiais, quer devido ao nosso progresso espiritual quer, paradoxalmente, ao nosso pecado ou mesmo fraqueza.
Assim, quando nos deparamos com grandes desafios, especialmente, como os servos de Deus no Antigo Testamento, sobressai em nosso coração a certeza do poder de Deus; o Deus da guerra. Quando estamos nós ou alguém de nossa família gravemente enfermo, além da soberania de Deus, clamamos pela sua misericórdia. Ao nos sentir continuamente injustiçado, recorremos à justiça de Deus.
Creio que em nossa santificação, sobressai com mais frequência o santo temor diante da majestade gloriosa de Deus. E, assim, tendemos a caminhar em nossa fé sabendo que Deus é tudo isso e muito mais do que possamos pensar.
Um dos atributos de Deus que deve nos acompanhar sempre, é a certeza de que Ele é o Deus perdoador. Ele pode nos perdoar de todos os nossos pecados. Mas, talvez alguém um tanto ingenuamente poderia perguntar: Por que este atributo tende a se sobressair em nossa mente? A resposta é simples. Porque somos pecadores. Temos consciência da necessidade de perdão. Como o ar é essencial à nossa existência física, o perdão é indispensável à nossa vida espiritual.
Quanto maior for a nossa proximidade de Deus, envolvendo um conhecimento de sua pessoa, mais teremos clareza a respeito de nossos pecados e de nossa total incapacidade de nos relacionar em santidade com o Deus santo. Deus é perfeito, nós somos imperfeitos; Ele é santo, nós pecadores; Ele é justo, nós injustos.
Nesse particular, Lloyd-Jones (1899-1981) é incisivo ao afirmar: “Se você não compreende que os seus pecados têm que ser perdoados, você não é um cristão”.[1] A declaração é contundente porque toca no cerne da fé cristã: o reconhecimento da própria culpa e da necessidade de redenção. A consciência do pecado não é um obstáculo à fé, mas sua porta de entrada. Sem ela, não há arrependimento genuíno, nem compreensão da graça.
Por isso, um dos grandes alentos que perpassam toda a Escritura − e de modo especial os Salmos, que funcionam como uma verdadeira “anatomia da alma” − é a certeza de que Deus é o Senhor do perdão.[2] Ele não apenas perdoa, mas se revela como o Deus perdoador, cuja misericórdia é renovada a cada manhã (Lm 3.22-23). Essa convicção sustenta o coração contrito e dá esperança ao pecador arrependido.
Quanto maior for nossa proximidade de Deus, envolvendo um conhecimento profundo de sua pessoa, mais clara se torna a percepção de nossos pecados e de nossa total incapacidade de nos relacionar com o Deus santo por méritos próprios. A santidade divina não apenas revela nossa impureza, mas também nos conduz à dependência da graça. Deus é perfeito, nós somos imperfeitos; Ele é santo, nós pecadores; Ele é justo, nós injustos. Essa assimetria não nos condena ao desespero, mas nos convida à reconciliação por meio de Cristo, o único mediador entre Deus e os homens (1Tm 2.5).
Enquanto nossa percepção da santidade de Deus, do pecado e da maldade inerente ao coração humano permanecer vaga, jamais compreenderemos plenamente a profundidade do perdão divino.
Distância qualitativa entre Deus e nós
Davi, no Salmo 25, reconhece a distância intransponível entre Deus e o ser humano. Seu problema não se limitava a desvios pontuais de conduta ou aos pecados cometidos na juventude. Ele entendia que o mal habitava em seu interior − no coração. Essa é a realidade de Davi e de todos nós: somos essencialmente pecadores.
Consciente disso, Davi clama pelo perdão de todas as suas iniquidades: “Por causa do teu nome, SENHOR, perdoa (xl;s)’ (salach) a minha iniquidade (}oWf()(‘ãwõn), que é grande.(…) Considera as minhas aflições e o meu sofrimento e perdoa (af’n”) (nasa)[3] todos os meus pecados (hf)f+Ah) (hatã’â)”[4] (Sl 25.11,18).
Pecado como perversão
Davi se apresenta diante de Deus como um iníquo. O sentido da palavra (}oWf()(‘awon) é de perverter, distorcer, envergar algo que é reto, encurvar, entortar − algo que deveria ser reto, mas foi entortado. A principal ideia está associada ao ato consciente, frequente e intencional de fazer o que é errado. Quando se aplica à lei, implica em transgressão deliberada, em desvio do caminho justo.
O pecado dos primeiros pais corrompeu a dimensão ética da imagem de Deus no homem. A corrupção foi tão séria e intensa, que o transgredido e pervertido, apresentou o status de normalidade. Sem um padrão externo de referência, torna-se impossível enxergar além daquilo que nos domina prazerosamente e é chamado de “realidade”.
A visão e a prática humanas tornaram-se tortuosas e desfocadas. O gosto pela transgressão passou a caracterizar o ser humano. Quando pecamos, nossa percepção se distorce em todas as áreas: perdemos a verdadeira dimensão da realidade. Nossa visão do mundo, da vida e de nós mesmos fica comprometida − até mesmo nossos afetos são afetados. Esse é o sentido da depravação total.[5]
Pecado fora de moda: Queda, Culpa Moral e Racionalizações
A culpa moral é uma das principais consequências subjetivas do pecado,[6] mesmo quando não conseguimos nomeá-la ou compreender sua origem. Na tentativa de aliviar esse sentimento, o ser humano recorre a diversos subterfúgios.
É comum buscar justificativas para atos iníquos. Criamos teorias − muitas vezes sofisticadas − que, ao menos para nós, parecem justificar nossas ações. E como isso nem sempre basta, tentamos persuadir os outros da integridade e necessidade de nossos atos, que passam a ser vistos como ousados, práticos ou inteligentes.
O pecado, então, é disfarçado de praticidade. O pecador não apenas racionaliza para si, mas deseja conquistar adeptos para sua visão e prática. Assim, busca legitimar seu pecado, tornando-o plausível aos olhos alheios. Daí a constante necessidade de “explicação” e “justificação” de nossos atos.
Contudo, essas racionalizações − mesmo quando acompanhadas de paliativos como medicamentos − não atingem o cerne do problema. Estão longe de resolver a questão do pecado e, consequentemente, da culpa.
Nem sempre basta racionalizar o pecado para si mesmo. Em muitos casos, buscamos também persuadir os outros da integridade e da suposta necessidade de nossos atos pecaminosos − que, nesse processo, deixam de ser apresentados como transgressões e passam a ser vistos como escolhas necessárias, ousadas e até inteligentes.
O pecado, por vezes, recebe o nome de praticidade. O pecador não apenas justifica sua conduta para si; ele deseja conquistar adeptos para sua visão e prática. A legitimação do erro exige que ele se torne plausível aos olhos alheios. Por isso, multiplicam-se as explicações e justificativas que tentam revestir o pecado de coerência e até de virtude.[7]
Essas racionalizações, muitas vezes acompanhadas por paliativos emocionais ou farmacológicos, podem oferecer algum alívio temporário. No entanto, não atingem o cerne do problema. São analgésicos da alma, incapazes de tratar a raiz da questão: o pecado e, consequentemente, a culpa. Como bem expressa o profeta Jeremias, “Curam superficialmente a ferida do meu povo, dizendo: Paz, paz; quando não há paz” (Jr 6.14; 8.11).
A palavra pecado há muito deixou de ocupar espaço no vocabulário cotidiano; Está forma de moda.[8] Embora sua prática permaneça, sua nomeação é evitada. Preferimos eufemismos que suavizam seu peso ou o descaracterizam por completo. Em alguns casos, chegamos à inversão de valores, tratando o pecado como virtude. Assim, em flagrante oposição às Escrituras, muitos passaram a interpretar a Queda como um mito de libertação − uma espécie de “cair para cima” que marca o início da autoconsciência humana. [9]
Paralelamente ao, em geral, bem-vindo progresso científico e tecnológico, certos conceitos tornaram-se tão amplamente difundidos em nossa sociedade que já não os avaliamos criticamente − apenas os absorvemos, como leite materno de uma cultura essencialmente contaminada desde sua gestação pecaminosa no Éden, quando nossos primeiros pais desobedeceram a Deus.
A partir dessa perspectiva, passamos a crer, por exemplo, que o mal não reside em nosso coração, mas tem origens externas. Assim, nos dedicamos a tratar questões externas como se, por meio delas, pudéssemos resolver todos os nossos problemas: a violência seria fruto de uma sociedade injusta; a gravidez indesejada, consequência da falta de informação e de uma educação sexual mais explícita; a imoralidade, culpa dos meios de comunicação − e assim por diante.
Enquanto mantivermos esses equívocos, continuaremos lidando com os efeitos, sem jamais enfrentar as causas. Não podemos esquecer que uma sociedade estruturalmente má e os chamados pecados sociais são, em última instância, cometidos por indivíduos perfeitamente socializados.
Com isso, nos tornamos especialistas em paliativos − que, embora tenham seu valor, não devem ser confundidos com soluções definitivas.
Essa é a denúncia de Deus contra os sacerdotes e profetas de Israel: “Curam superficialmente a ferida do meu povo, dizendo: Paz, paz; quando não há paz” (Jr 6.14; Jr 8.11).
A releitura da Queda como ascensão revela uma tensão fundamental entre autonomia e graça. Ao transformar o pecado em virtude, corremos o risco de perder o senso de necessidade da reconciliação. A narrativa bíblica, longe de negar o valor da liberdade, aponta para uma liberdade reconciliada − não conquistada pela transgressão, mas restaurada pela graça.
O desafio contemporâneo é, portanto, recuperar uma linguagem bíblica que reconheça tanto a dignidade humana quanto sua urgente necessidade de redenção.
Algumas considerações
Antes de apontarmos para os males da sociedade, somos convocados a examinar o próprio coração. A verdadeira transformação começa no interior, com humildade diante de Deus e o reconhecimento sincero de nossa necessidade de redenção.
Nenhum avanço é neutro. Precisamos avaliar criticamente os valores que absorvemos da cultura — mesmo aqueles que nos parecem “naturais” ou “científicos”. A cosmovisão bíblica nos oferece os critérios necessários para essa análise, iluminando o discernimento entre o que edifica e o que corrompe.
A mudança social não se concretiza apenas por meio de reformas externas, mas exige uma renovação profunda da mente e do caráter. Isso implica investir em formação espiritual, em discipulado consistente e em comunidades que vivam a reconciliação como testemunho vivo da graça.
Em tempos marcados pelo relativismo moral, torna-se urgente resgatar uma linguagem que afirme, simultaneamente, a dignidade humana e sua queda − apontando, com clareza e esperança, para a restauração possível pela graça de Deus.[10]
Mesmo diante da decadência cultural e da superficialidade das soluções humanas, há esperança. A narrativa bíblica não termina na Queda, mas culmina na redenção. Essa é a boa nova que somos chamados a viver e proclamar com coragem, convicção e compaixão.
Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa
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[1]D.M. Lloyd-Jones, O Supremo propósito de Deus: Exposição sobre Efésios 1.1-23, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1996, p. 156. Do mesmo modo: Ibidem., p. 227).
[2] Veja-se: Robert B. Chisholm Jr. Perdão e salvação em Isaías 53: In: Darrell L. Bock; Mitch Glaser, O Servo sofredor, São Paulo: Cultura Cristã, 2015, p. 164-165.
[3] A palavra usada para perdão (af’n”) (nasa) tem o sentido de “elevar”, “carregar”, “remover”, ”levar embora”, “remir”, “levantar”, “cobrir”, “livrar”. Este termo que é usado de modo figurado e literal, apresenta de forma metafórica, a ideia de que o pecado cometido foi levantado e carregado (removido) para longe; esquecido. (Gn 18.26; 50.17; Ex 10.17; Jó 11.6; Sl 25.18; 32.1,5; 85.2; Is 2.9; 33.24; 44.21). Para um estudo mais aprofundado do termo hebraico, vejam-se: Victor Hamilton, Ns’: In: Willem A. VanGemeren, org. Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 3, p. 163-167; Robert B. Girdlestone, Synonyms of the Old Testament, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, (1897), Reprinted, 1981, p. 137-138; N.H. Snaith, Forgive, Forgiveness: In: Alan Richardson, ed. A Theological Word Book of the Bible, London: SCM Press, 13. impression, 1975, p. 85-86.
[4]O pecado (hf)f+Ah) (hatã’â) pressupõe a existência de um padrão estabelecido que foi simplesmente desconsiderado. Desse modo, errou-se, ficou aquém o alvo proposto por Deus.
Portanto, pecado consiste no desvio daquilo que é agradável a Deus; distanciar-se do caminho, desviar-se da obediência devida a Deus.
Essa é a principal palavra usada para descrever o sentido do pecado: errar o alvo ou o caminho. (Cf. G. Herbert Livingston, hãtã’: In: R. Laird Harris, et. al. eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, [p. 450-453], p. 450).
O pecado (hf)f+Ah)(hatã’â), na maioria das ocorrências da palavra (Exceções: Lv 4.2; 5.15; Nm 15.28), é compreendido como uma atitude consciente e, por isso, responsável, que consiste em uma alienação de Deus e uma violação da relação com outros homens. (Veja-se: Alex Luc, Ht’: In: Willem A. VanGemeren, org. Novo Dicionário Internacional de Teologia e Exegese do Antigo Testamento, São Paulo: Cultura Cristã, 2011, v. 2, [p. 85-91], p. 87). É um andar errante. Enfatiza-se a ideia de que toda má ação é um fracasso ou seja: deixar de alcançar o objetivo que Deus tem para os seus filhos. (Cf. Robert B. Girdlestone, Synonyms of the Old Testament, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans, (1897), Reprinted, 1981, p. 76-77).
[5]“Assim como o pecado original se estende por toda a humanidade, ele se estende também por toda a pessoa. Ele exerce influência sobre toda a pessoa, sobre a mente e a vontade, o coração e a consciência, a alma e o corpo, sobre todas as capacidades e poderes de uma pessoa” (Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 3, p. 123). Veja-se o excelente artigo de MacArthur. (John F. MacArthur, O aconselhamento e a pecaminosidade humana: In: John F. MacArthur, et. al. eds. Introdução ao aconselhamento bíblico: um guia básico dos princípios e prática do aconselhamento, São Paulo: Hagnos, 2004, p. 123-141).
[6] Veja-se: Carl Schultz e Bruce K. Waltke, ‘ãwâ: In: R. Laird Harris, et. al. eds. Dicionário Internacional de Teologia do Antigo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1998, p. 1087.
[7]Para uma conexão sociológica, vejam-se: Peter L. Berger; Thomas Luckmann, A Construção Social da Realidade, 5. ed. Petrópolis, RJ.: Vozes, 1983, p. 28 e Peter L. Berger, Rumor de Anjos: A sociedade moderna e a redescoberta do sobrenatural, 2. ed. rev. Petrópolis, RJ.: Vozes, 1997, p. 66-69; Julien Freund, A Sociologia de Max Weber, Rio de Janeiro: Forense, 1980, p. 173.
[8]“O desaparecimento do pecado do nosso vocabulário moral é uma das marcas da Idade Moderna – e da moralidade pós-moderna. Nestes dias, a maioria das pessoas acredita ser imperfeita, com espaços para melhorias – mas não pensam em si mesmas como pecadores necessitados de perdão e de redenção” (Albert Mohler Jr. O Desaparecimento de Deus, São Paulo: Cultura Cristã, 2010, p. 31).
[9]Sob outra perspectiva, essa concepção encontra ressonância no pensamento de G.W.F. Hegel (1770–1831), que interpreta a narrativa de Gênesis não como um relato histórico literal, mas como uma representação simbólica e universal do processo dialético de formação do espírito humano. Para Hegel, a saída do Paraíso — compreendida como o abandono da condição de inocência natural — constitui um passo necessário rumo à autoconsciência e à liberdade. Esse movimento implica uma separação entre o ser humano, Deus e a natureza, condição indispensável para uma futura reconciliação mais profunda e consciente. A leitura da Queda como parábola filosófica é, portanto, um elemento central na filosofia hegeliana da história e do espírito. (Veja-se, por exemplo, Lectures on the Philosophy of Religion (London: Kegan Paul, Trench, Trübner & Co. Ltd., 1895, v. 1, p. 270ss., especialmente p. 271 e 275). Para uma edição crítica, cf. Lectures on the Philosophy of Religion, vol. II – Determinate Religion, ed. Peter C. Hodgson (Berkeley: University of California Press, ©1987, 1995, p. 436ss., 441ss., 451ss.). A introdução editorial (p. 1-90) é particularmente esclarecedora, mesmo tratando de um autor cuja linguagem é notoriamente complexa. Nas p. 88–89, Hodgson apresenta um gráfico que sistematiza o tratamento do tema conforme as diferentes edições dos manuscritos, evidenciando que essa obra resulta, em grande parte, de anotações feitas por seus alunos durante as aulas de Hegel.
Aliás, o presbiteriano Peter C. Hodgson, amplamente reconhecido por sua clareza editorial, figura entre os principais responsáveis pela reintrodução de Hegel no debate teológico contemporâneo, especialmente no contexto anglo-americano. Seu trabalho busca conciliar a filosofia idealista hegeliana com a teologia cristã, mantendo, contudo, um firme compromisso com a tradição protestante. Por meio de suas edições críticas, comentários e obras sistemáticas, Hodgson tornou acessível um pensamento notoriamente complexo, abrindo espaço para uma leitura teológica do idealismo que dialoga com a fé reformada e com os desafios da modernidade.
O psicanalista Rollo May (1909–1994), fortemente influenciado por Paul Tillich (1886–1965), retoma o conceito hegeliano e o aplica à ideia de coragem criativa. Em obras como A Coragem de Criar (Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1982, p. 27–30), O Homem à Procura de Si Mesmo (5. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1976, p. 150–160) e A Procura do Mito (São Paulo: Manole, 1992, p. 14–15; 28–29), May explora como o enfrentamento da separação e da angústia existencial pode ser transformado em força criadora, reafirmando a dimensão espiritual e filosófica da Queda como impulso para a realização humana.
Curiosamente, a leitura do “cair para cima” encontra paralelo na teologia dos Santos dos Últimos Dias, conforme O Livro de Mórmon, 2 Néfi 2.22–26, escrito em 1830, onde se afirma de modo hedonista: “Adão caiu para que os homens existissem; e os homens existem para que tenham alegria” (25). Essa formulação — “caiu para que” — aproxima-se da ideia de que a Queda, embora trágica, é também instrumento de progresso espiritual, abrindo caminho para a liberdade e a redenção.
(O Livro de Mórmon, 2 Néfi 2.22–26. Disponível em: churchofjesuschrist.org. [Consulta feita em 19.09.2025]).
[10] “Estou convencido de que uma das grandes fraquezas na pregação evangélica nos últimos anos é que nós perdemos de vista o fato bíblico de que o homem é maravilhoso. (…) O homem está realmente perdido, mas isso não significa que ele não é nada. Nós temos que resistir ao humanismo, mas classificar o homem como um zero não é o caminho certo para resistir a ele. Você pode enfatizar que o homem está totalmente perdido e ainda ter a resposta bíblica de que o homem é realmente grande. (…) Do ponto de vista bíblico, o homem está perdido, mas é grande” (Francis A. Schaeffer, Morte na Cidade, São Paulo: Cultura Cristã, 2003, p. 60,61). “Jamais estaremos em condições de tratar as pessoas como seres humanos, de atribuir a elas o mais alto nível de humanidade verdadeira, a menos que realmente conheçamos a sua origem – quem essas pessoas são. Deus diz ao homem quem ele é. Deus nos diz que Ele criou o homem à sua imagem. Portanto, o homem é algo maravilhoso. (…) A Bíblia diz que você é maravilhoso porque foi feito à imagem e semelhança de Deus, mas que você é imperfeito, porque em certo espaço-temporal da História, o homem caiu” (Francis A. Schaeffer, A Morte da razão, São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 34). São muito oportunas e sensíveis as analogias feitas por Olyott. (Veja-se: Stuart Olyott, Jonas – O missionário bem-sucedido que fracassou, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2012, p. 75).