Anthony Chute abre seu ensaio introdutório em Why We Belong [Por que pertencemos] — um livro que explora a unidade evangélica e a diversidade denominacional — recontando uma cena do clássico de Charles Schulz, de 1966, It’s the Great Pumpkin, Charlie Brown [É a Grande Abóbora, Charlie Brown]:
… uma conversa interessante acontece, enquanto Linus escreve sua carta anual para a Grande Abóbora. “Quando você vai parar de acreditar em algo que não é verdade?”, pergunta Charlie, ao que Linus retruca: “Ora, quando você parar de acreditar naquele sujeito de roupa vermelha e barba branca que diz ‘Ho, Ho, Ho’!”. Charlie Brown olha para a câmera e diz com secura: “Estamos obviamente separados por diferenças denominacionais.”
A resposta de Linus é bizarra, mas menciona algo substancial. As diferenças denominacionais podem parecer gritantes. Sua resposta é também uma janela intrigante para o próprio Schulz, que cresceu nominalmente luterano, depois se filiou a uma congregação da Igreja de Deus, em Minnesota, mais tarde frequentou uma Igreja Metodista Unida, quando se mudou para a Califórnia e, por fim, distanciou-se por completo da igreja. Em seus últimos anos, Schulz gracejava: “Acho que se pode dizer que me converti ao humanismo secular” (Good Grief: The Story of Charles M. Schulz [Que puxa: A história de Charles M. Schulz]).
Ao ler sua história, não posso deixar de me perguntar o que motivou todas essas mudanças. Elas foram teológicas? Pessoais? Como os pastores dessas igrejas o aconselharam nesses momentos? Ele foi rejeitado? Pode ter havido muitos fatores. A relação entre convicções pessoais, a igreja local e a filiação denominacional raramente é simples.
Escrevo como um batista do Sul convicto. Fiz meu mestrado em um dos seminários da nossa denominação. Também tenho um doutorado profissional em um seminário que defende seu ecumenismo evangélico, e agora estou cursando doutorado em um seminário filiado à Igreja Anglicana da Austrália (e sim, eu ainda sou batista). Aos domingos, pastoreio com prazer uma igreja batista na Carolina do Norte, onde temos alguns membros vindos de diversas tradições evangélicas protestantes.
Alguns fizeram a transição [para a nossa denominação] porque suas convicções doutrinárias mudaram. Outros fizeram essa mudança porque vieram morar na região e foram atraídos por convicções compartilhadas ou por conexões relacionais. E, ocasionalmente, alguém sai [da nossa denominação] pelos mesmos motivos.
Mas há aqueles que saem — ou cogitam sair — não por causa da nossa pregação ou de nossas políticas, mas porque estão incomodados com nossos laços denominacionais. Para alguns, as preocupações estão ligadas a feridas profundas ou a experiências dolorosas do passado, devido à forma como nossa denominação lidou com questões específicas. Há também aqueles que consideram sair não por causa de heresia ou de escândalo, mas por desilusão. Estão cansados, irritados ou simplesmente atraídos por outra tradição por questões secundárias, como o significado e a forma do batismo, ou por questões terciárias, como a escatologia. Momentos assim exigem mais do que meras explicações. Exigem presença pastoral, clareza e paciência.
Independentemente da tradição, não é incomum que membros de uma igreja levantem preocupações relativas à filiação denominacional. Talvez tenham lido algo nas redes sociais. Talvez tenham visto a manchete de alguma reportagem em algum veículo de comunicação de peso. Às vezes, essa reportagem está correta, mas a preocupação de que ela trata é moldada pela confusão sobre como as denominações realmente funcionam. Outras vezes, a reportagem contém falhas — motivadas por interpretações errôneas ou por queixas pessoais. E, às vezes, a preocupação de que ela trata é bem embasada e se justifica.
Parte do trabalho de liderança pastoral envolve o esclarecimento da identidade e do propósito de nossas estruturas denominacionais. A palavra denominação deriva do latim denominare, que significa “nomear” ou “dar nome”. Em outras palavras, as denominações nomeiam suas características distintivas. Fazer isso é bom porque esclarece convicções importantes e molda parcerias missionárias. Em termos gerais, as denominações evangélicas sempre surgiram na intersecção entre convicção e cooperação. Elas ajudam as igrejas a se situarem dentro de uma tradição confessional, fornecendo limites teológicos e alinhamento prático.
As estruturas denominacionais fornecem sistemas de responsabilização e de organização. Elas criam espaço para propósitos compartilhados — missões, assistência, educação. De muitas maneiras, elas formalizam as diretrizes para os tipos de ministério colaborativo que vemos no Novo Testamento (veja Atos 15.1-35; 1Coríntios 16.1; 2Coríntios 8.1-7, 19). As estruturas atuais podem variar, mas seu propósito não é novo.
Portanto, quando um membro estiver considerando sair de sua igreja por causa da filiação denominacional, pode ser útil descrever para ele como essa filiação realmente funciona. Como o corpo denominacional mais amplo se relaciona com o corpo da igreja local? Que tipo de autoridade a denominação exerce? O ponto em questão sequer chega ao nível local? Às vezes, o ponto que gera preocupação tem pouca influência sobre a igreja local. Outras vezes, tem mais influência. Em ambos os casos, o membro [que está cogitando sair] pode precisar de ajuda para enxergar a conexão com clareza.
Quando possível, os desiludidos podem ser encorajados a permanecer e a servir como agentes de mudança. Como muitos outros corpos associativos, as denominações frequentemente refletem o velho ditado “Você recebe o que investe”. É claro que isso varia entre as denominações protestantes. Mas, em geral, descobri que muitas pessoas têm expectativas equivocadas em relação à sua compreensão de uma denominação. Embora não exista igreja nem denominação perfeita, ainda acredito que as denominações sirvam a um bom propósito.
Além de esclarecer como uma denominação funciona, é vital entender o que realmente está por trás da preocupação de cada membro. Antes de se reunir com um membro da igreja para tratar desses assuntos, ore por sabedoria bíblica e pela orientação do Espírito — isso é essencial. Tiago nos lembra que, se nos falta sabedoria, devemos pedir a Deus, “que a todos dá generosamente” (Tiago 1.5). Sabedoria é frequentemente o que precisamos, pois a relação entre convicções pessoais, igreja local e filiação denominacional pode ser complexa.
Isso também exige escuta paciente e perguntas intencionais. Provérbios 20.5 diz: “Os propósitos do coração do homem são águas profundas, mas quem tem entendimento os traz à tona”. Esse é o nosso objetivo. Por trás de cada preocupação há algo mais profundo — talvez medo, talvez frustração, talvez um desejo por justiça, talvez uma genuína mudança teológica. Mas nós jamais saberemos, a menos que façamos perguntas diretas.
Acho que pode ser útil colocar sobre a mesa as seguintes perguntas:
• Você está pensando em sair porque os líderes da nossa igreja ou da denominação adotaram doutrinas falsas, promoveram ensinamentos heréticos ou se recusaram a confrontar aqueles que ensinam tais coisas?
• Você está pensando em sair porque comportamentos imorais, antiéticos e antibíblicos são ignorados ou tolerados entre os líderes ou membros desta igreja ou da nossa denominação?
• Suas preocupações são baseadas em convicções bíblicas ou em conflitos comunitários?
• As preocupações que o levaram a considerar essa saída são uma reação precipitada ou uma saída consciente, decidida em espírito de oração?
• Você já refletiu sobre as implicações dessa decisão para a sua fé, a sua família e o seu futuro?
Essas perguntas podem abrir caminho para conversas difíceis. E, às vezes, as respostas são difíceis de ouvir. Por isso, é essencial estar ciente de sua disposição. Todo membro resmunga de vez em quando, mas dói quando alguém lhe diz que está pensando em sair da igreja. É difícil não levar para o lado pessoal — mesmo que os motivos da saída se estendam para além da igreja, alcançando a denominação.
À medida que essas conversas se desenrolam, ajuda muito lembrar as palavras de Paulo a Timóteo: “corrija, repreenda, encoraje com toda a paciência e ensino” (2Timóteo 4.2). Esse tipo de pastoreio deve sempre andar de mãos dadas com o que Paulo diz em 1Tessalonicenses 5.14: “admoestem os ociosos, confortem os desanimados, auxiliem os fracos, sejam pacientes para com todos”. É fácil ignorar esse último conselho, mas ele é importante: paciência é algo que devemos ter com todos.
Diante disso, frequentemente me pergunto: quais preocupações posso honrar e quais convicções devo desafiar? Essa pergunta orienta o modo como respondo, seja oferecendo um conselho, uma correção ou aconselhando cautela. No fim das contas, somos chamados a ser modelos de pastoreio gracioso, sábio e que não fica na defensiva — que sabe quando ouvir, quando resistir e quando deixar ir, apoiando e cuidando.
E se for hora de deixar ir, tento lembrar a pessoa de que existe uma maneira certa e uma maneira errada de sair. Espero que essa pessoa consiga falar graciosamente sobre como Deus usou a igreja em sua vida, possa compartilhar suas razões [para sair] com humildade e sabedoria, e não tocar fogo na ponte atrás de si ao sair. Afinal, seus irmãos e irmãs em Cristo ainda ficarão por aqui. Como Paulo escreveu, devemos fazer “todo o esforço para conservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (Efésios 4.3).
Por fim, permita-me fazer uma sugestão que pode ser útil preventivamente.
A priori, ter um processo de adesão para membros que seja mais robusto permite que a igreja defina suas convicções confessionais e distinções denominacionais. Entrar para uma igreja local ou sair dela nunca deve ser uma decisão fácil, leviana. É por isso que, quando entrevistamos novos membros, fazemos perguntas específicas, para entender o motivo por trás do desejo deles de se juntar à nossa igreja, especialmente se vierem de uma igreja com a mesma mentalidade em nossa região.
Também seguimos o exemplo de outras igrejas e desenvolvemos um pacto eclesiástico que define as expectativas dos nossos membros. Em muitos desses pactos, você encontrará uma frase semelhante a esta: “Se eu deixar esta congregação, me unirei o mais breve possível a outra igreja que prega o evangelho, na qual possa colocar em prática o espírito deste pacto e os princípios da Palavra de Deus”. Uma frase como essa permite que os futuros membros saibam de antemão: “Se você sair, entraremos em contato com você porque nos importamos com a sua alma”. Em uma cultura moldada pelo individualismo consumista, declarações como essa importam. Elas criam espaço para expectativas claras e responsabilidade.
Mencionamos tudo isso para dizer que, quando se trata de cristãos e de membresia de igrejas, estou convencido de que ser claro sobre as diferenças doutrinárias e denominacionais desde o início é tão importante quanto a forma como você pastoreia alguém, quando essa pessoa está decidindo se deve ou não deixar a igreja local.
Afirmo com o Credo Niceno que “creio em uma só Igreja santa, universal e apostólica”. Mas também estou ciente de que, dentro do protestantismo, temos “um só Senhor, uma só fé”, mas muitas formas de expressão. Concordo com Carl Trueman, que certa vez disse em um painel de discussão: “Graças a Deus pelas denominações. Elas significam que alguém, em algum lugar, de fato crê em algo!”
Não devemos diluir nossas diferenças. Devemos deixá-las mais claras. Em alguns casos, essas diferenças são secundárias ou terciárias, e tratam de questões relativas à teologia ou à prática ministerial. No entanto, existem outros casos — quando comparamos as tradições protestantes com as tradições dos católicos romanos, da Igreja Ortodoxa Oriental, das Testemunhas de Jeová ou dos mórmons — em que não há pontos em comum em questões como a autoridade bíblica, a doutrina de Deus e a salvação. Possíveis desvios na primeira categoria exigem cuidado e gentileza. Possíveis desvios nesta segunda categoria exigem que ofereçamos clareza e forte cautela.
No final, quando se trata dos meus irmãos e irmãs protestantes que pensam como eu, volto à oração de Jesus — para que, em sua unidade, os cristãos “sejam um” no que diz respeito a questões primordiais da ortodoxia histórica (João 17.21).
Matthew Z. Capps atua como pastor titular da Igreja Batista Fairview, em Apex, Carolina do Norte, e como segundo vice-presidente dos Batistas da Carolina do Norte. Ele é autor de vários livros, entre eles Drawn by Beauty [Atraído pela beleza] e Every Member Matters [Todo membro importa].
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