A perseguição como marca cristã

Igreja rachada e sobre chamas.
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A perseguição como marca cristã

I Tessalonicenses 2.13-16 

O texto em destaque pode ser dividido em dois grandes temas: 1. A perseguição como uma característica daqueles que ouviram e foram regenerados pelo Evangelho. 2. A situação dos perseguidores da Igreja diante de Deus. 

“Mais um motivo de alegria”

Toda a carta de I Tessalonicenses converge para a gratidão a Deus por parte de Paulo, pois aqueles a quem ele havia pregado o Evangelho haviam se convertido. Além disso, os tessalonicenses estavam demonstrando essa conversão com ações práticas.

Paulo acrescenta mais um motivo de alegria: a forma como os tessalonicenses ouviram a pregação do Evangelho. Ele diz: “Ao receberem a palavra que de nós ouviram, que é de Deus, vocês a acolheram não como palavra humana, e sim como, em verdade é, a palavra de Deus”.

Entender que o Evangelho é a revelação do próprio Deus faz toda a diferença. Primeiramente, Cristo é a própria Palavra (logos); em segundo lugar, levar o Evangelho a sério é entender que toda a nossa vida necessita ser reordenada. Em outras palavras, há um jeito certo de se ouvir a mensagem assim como há também um jeito errado.

Implicações do “jeito certo”

Uma evidência de que alguém creu e foi regenerado pelo Evangelho é que haverá perseguições.

Essa temática não é estranha aos cristãos, nem mesmo ao povo de Deus, se formos ampliar aos crentes do Antigo Testamento. Justos sempre foram atormentados por ímpios de alguma forma. Exemplos como os de José e seus irmãos, Moisés e Faraó, Davi e Saul são apenas algumas das situações clássicas de perseguição pelas quais servos de Deus tiveram que passar.

Os profetas certamente são os melhores exemplos, pois foram perseguidos pelo seu próprio povo, assim como os tessalonicenses estavam sendo. Neemias escreve acerca disso: “Ainda assim foram desobedientes e se revoltaram contra ti; viraram as costas à tua Lei e mataram os teus profetas, que testemunhavam contra eles, para os fazerem voltar a ti; e cometeram grandes blasfêmias” (Ne 9:26).

Jesus também nos traz essa mesma realidade: “Ai de vocês! Porque edificam os túmulos dos profetas que os pais de vocês assassinaram. Assim, são testemunhas e aprovam com cumplicidade as obras dos pais de vocês; porque eles mataram os profetas, e vocês edificam túmulos para eles” (Lc 11:47-48).

De fato, o testemunho da verdade sempre foi um incômodo. Tal como escreve João, aqueles que estão nas trevas não querem se aproximar da luz, pois sabem que se assim fizerem terão as suas obras vistas como erradas e, portanto, serão reprovadas (Jo 3:20). Assim, não é de se estranhar que perseguições ocorram para com a Igreja se ela está pregando o Evangelho, pois a última coisa que os réprobos irão querer são os holofotes do Evangelho revelando o quão podres eles são.

O Senhor Jesus havia dito categoricamente que perseguições ocorreriam contra aqueles que fossem seus discípulos. Ele disse: “Bem-aventurados são vocês quando, por minha causa, os insultarem e os perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra vocês. Alegrem-se e exultem, porque é grande a sua recompensa nos céus; pois assim perseguiram os profetas que viveram antes de vocês.” (Mt 5:11-12).

Quando Cristo nos diz que seremos felizes mediante as perseguições, é mais um indicativo de que isso não está fora do controle de Deus, e Ele sabe até onde podemos aguentar. As perseguições são parte de uma vida cristã saudável.

Curiosamente, devemos nos alegrar porque “assim perseguiram os profetas que viveram antes de vocês” – esse versículo é quase um espelho de I Ts 2:14b. Devemos nos alegrar “porque é grande a sua recompensa nos céus”. Isso nos leva a crer que a perseguição é algo inevitável quando se é um cristão: “Na verdade, todos os que querem viver piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos.” (2 Tm 3:12).

Sobre isso, o comentarista William Hendriksen diz: “A disposição para sofrer por Cristo é prova de discipulado. Ela comprova que a Palavra de Deus está atuando no coração. Ela une os crentes, de tal modo que passam a constituir uma verdadeira irmandade, à qual não pode pertencer quem não esteja disposto a assim sofrer.”

Para Hendriksen, o discípulo de Cristo está disposto a sofrer, e isso demonstra que ele realmente entendeu o Evangelho. Mais uma vez, as palavras de Paulo no versículo 13 ecoam: “Vocês a acolheram não como palavra humana, e sim como, em verdade é, a palavra de Deus”. Não basta só sofrer estoicamente; o cristão deve ter em mente que seus sofrimentos, uma vez que são fruto do testemunho fiel de Cristo, são um sinal de maturidade cristã e uma marca de um verdadeiro discípulo de Cristo.

Agora, nos versículos 15 e 16, Paulo fala acerca dos perseguidores, dando ênfase nos judeus como exemplo. Por que alguém perseguiria a Igreja de Cristo?

Resposta:

  1. Suas obras são réprobas (Jo 3:20).
  2. São filhos do diabo (Jo 8:43-45).
  3. São inimigos de Deus (Cl 1:21).

A igreja de Tessalônica estava sofrendo perseguição por parte de seus patrícios, ou seja, seus conterrâneos. Paulo diz que foi igual ao que ocorreu com a igreja de Jerusalém, quando esta foi perseguida pelos judeus que lá viviam (I Ts 2:14b). Ele então segue trazendo a realidade do porquê esses judeus fizeram o que fizeram – e Paulo sabia disso como ninguém, uma vez que ele próprio foi um perseguidor desses mesmos irmãos em Jerusalém, e não cansava de respirar ameaças de morte contra eles (cf. At 9:1).

As palavras de Paulo acerca desses judeus parecem muito duras – sobretudo quando comparamos sua postura em Romanos 9, 10 e 11 – mas é necessário entender que o contexto favorece palavras duras. Paulo está expondo a dureza de coração dos judeus a fim de ilustrar aos tessalonicenses o porquê de eles estarem sendo perseguidos pelos seus patrícios em Tessalônica.

A perseguição em Jerusalém e a perseguição em Tessalônica tiveram a mesma causa: inimigos de Deus e do Evangelho unidos para extinguir a luz do mundo que são os discípulos de Cristo. É notável o fato de que aqueles que ouvem a mensagem corretamente são perseguidos por aqueles que não entenderam ou simplesmente rejeitaram.

Assim, a “ira” caiu sobre os judeus, assim como cai sobre todo aquele que está contra o Evangelho, e essa ira nada mais é do que a dureza do coração deles “a fim de encherem sempre a medida dos seus pecados” (v. 16). Essa oposição ao Evangelho já é uma manifestação da ira de Deus contra os ímpios, e assim continuarão a resistir até que a última gota de seus pecados transborde, e assim sejam eternamente castigados.

Conclusão

A entrega total ao Reino é uma marca fundamental de todo cristão verdadeiro. Quem não ao menos se empenha em servir, ainda que um pouco, não é de fato um discípulo de Cristo. Afinal, quem bota a mão no arado e olha para trás não serve para o Reino de Deus (Lc 9:62).

Não devemos desanimar diante das perseguições, pois todos os verdadeiros servos de Deus foram perseguidos. Se nós também formos, isso é motivo de alegria, pois atesta que somos legítimos servos do Deus vivo.

Finalmente, ninguém poderá impedir o avanço do Evangelho. Por mais inimigos que surjam, a pregação do Reino vai vencendo para vencer (cf. Ap 6:1-2). A Cristo, todo poder foi dado no céu e na terra (Mt 28:18-19), e por essa razão podemos e devemos pregar o Evangelho a toda criatura. Também, por esse motivo, a mensagem de salvação é imparável. Nem os maiores esforços de Satanás, nem as piores perseguições que nos forem impostas, conseguirão impedir que a mensagem do Reino seja barrada. Todos os eleitos serão reunidos, e “Ele verá o fruto do trabalho de sua alma e ficará satisfeito. O meu Servo, o Justo, com o seu conhecimento justificará a muitos, porque as iniquidades deles levará sobre si.” (Is 53:11).