Quando Deus não atende nossas orações

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Quando Deus não atende nossas orações

Há muitos exemplos de orações não atendidas na Escritura, e pelas mais variadas razões possíveis. Sabemos que Deus rejeita certos tipos de orações: as avarentas, gananciosas, fruto da carne e sem proveito para a santificação ou para a glória de Deus, pois “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes.” (Cf. Tiago 4:1 – 6).

Contudo, aqui gostaria de meditar em uma oração específica, esta feita em meio a dor de um coração sincero que gostaria de evitar o sofrimento, mas que ainda assim recebe de Deus uma resposta negativa, aqui me refiro a oração de Cristo na noite em que foi traído. O Evangelho segundo Lucas registra esse momento da seguinte forma:

E, saindo, Jesus foi, como de costume, para o monte das Oliveiras; e os discípulos o acompanharam. Chegando ao lugar escolhido, Jesus lhes disse: — Orem, para que vocês não caiam em tentação. Ele, por sua vez, se afastou um pouco, e, de joelhos, orava, dizendo: — Pai, se queres, afasta de mim este cálice! Contudo, não se faça a minha vontade, e sim a tua. Então lhe apareceu um anjo do céu que o confortava. E, estando em agonia, orava mais intensamente. E aconteceu que o suor dele se tornou como gotas de sangue caindo sobre a terra. (Lucas 22:39- 44, NAA).

Há alguns pontos que merecem destaque na breve exposição desses versículos, para que então compreendamos o que podemos aplicar em nossa vida cristã acerca do tão temido “não de Deus”, e assim estarmos preparados quando o Senhor ou responde negativamente as nossas orações, ou simplesmente não nos diz nada.

I. A oração é indispensável

Muitos poderiam argumentar que se há uma boa chance de Deus nãos nos atender quando oramos, então para que orar? De fato há uma possibilidade de que o Senhor não nos atenda, no entanto, ainda assim, a oração faz parte da vida do povo de Deus desde praticamente sempre. Vemos como Moisés foi um homem de oração; o Cântico de Ana tornou-se famoso pelo seu quebrantamento e aflição diante de Deus; Davi e vários outros salmistas fazem orações de agradecimento, louvor, pedidos de justiça divina e livramento, compondo assim tudo que entendemos como sendo o livro dos Salmos.

Quando olhamos para o Novo Testamento não é diferente, e é o próprio Cristo que nos ensina a orar e esperar (perseverar); lembremos de certa parábola que o Senhor conta acerca de um corrupto e inflexível juiz, o qual se recusava a julgar a causa de uma viúva, no fim, após tanta insistência da parte daquela mulher, o juiz cede e aceita o julgamento. Jesus conclui dizendo que se um juiz corrupto pode fazer justiça quando é importunado constantemente, “será que Deus não fará justiça aos seus escolhidos, que a ele clamam dia e noite, embora pareça demorado em defendê-los?” (Lucas 18:7).

A oração na vida do Cristão é de fato indispensável. Martinho Lutero dizia que a “oração é o forte muro e fortaleza da Igreja; é a arma do bom cristão”. E de fato ela fez e continua fazendo parte da vida de todos os homens e mulheres piedosos na história da igreja, e isso devido ao seu caráter divino, e que nos conecta ao nosso Deus. Jesus orava, e isso por si só seria suficiente para nós o imitarmos. Nisso, a oração proferida pelo Senhor no seu então maior momento de angustia, pode muito nos ensinar.

II.  A oração e a tristeza

Mesmo que busquemos negar, a maioria das vezes que oramos com mais intensidade (ou com mais frequência), são nos momentos mais escuros da nossa vida. Esse não era o caso de Jesus; o mestre buscava estar sempre em comunhão com o Pai por meio da oração, chegando inclusive a dispensar pessoas e retirar para lugares isolados a fim orar.

Não é de se estranhar então que, no seu mais sombrio momento neste mundo, Jesus também se recolhesse para orar ao Pai. No entanto, a oração de Jesus não foi atendida, mas ainda assim as coisas terminaram bem por assim dizer.

Normalmente os judeus da época faziam suas orações de pé e com as mãos levantadas e os olhos fitos aos céus, contudo, Lucas aponta que Jesus se prostrou, ficando de joelhos, demonstrando sua humilhação e quebrantamento diante de Deus.

E aqui, em meio a esta oração, e sabendo do que lhe aguardava, Jesus em sua tristeza pede ao Pai que afastasse o “cálice”. No Antigo Testamento, o “cálice” estava associado com o sofrimento e também com a ira de Deus (cf. Sl 11:6; Is 51:17; Ez 23:33); de forma geral, no Antigo Oriente, “cálice” correspondia a uma determinada proporção de algo, fosse bom ou mal. Aqui o que Jesus está pedindo é o afastar da proporção de sofrimento que lhe estava reservado.

Jesus sabia que teria de passar por um sofrimento sem igual, o primeiro seria a tortura da cruz, a mais violenta das mortes da época, mas seu maior sofrimento seria quando Deus viraria sua face para ele, abandonando-o na cruz, no momento exato em que Jesus estava substituindo o pecador caído, tomando seu lugar na cruz (Mc 15:34).

Motivos para ficar triste não faltavam ao mestre, uma vez que por alguns momentos, sua eterna e perfeita união com o Pai seria rompida a fim de que Cristo fosse punido no lugar dos pecadores.

Isso demostra ainda que Jesus era humano, assim como nós, e partilhou do nosso medo da dor e do sofrimento, e graças a isso “(…) não temos sumo sacerdote que não possa se compadecer das nossas fraquezas; pelo contrário, ele foi tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado.” (Hb 4:15).

Diferentemente do que os docetistas diriam, Cristo não veio apenas com uma aparência humana, ou ainda em uma teofania como as do Antigo Testamento; o Verbo de fato se fez carne e caminhou entre nós, de modo que o medo do sofrimento expresso por Jesus expressa sua humanidade e identificação conosco, e assim temos um perfeito intercessor diante de Deus, razão essa pela qual podemos nos aproximar “do trono da graça com confiança, a fim de recebermos misericórdia e encontrarmos graça para ajuda em momento oportuno.” (Hb 4:16).

Então mesmo em meio a tristeza somos encorajados a orar, e nos aproximar do trono de Deus sabendo que ele ao menos nos ouvirá, e mais, sabendo que Cristo está lá intercedendo por nós, uma vez que ele mesmo experimentou as nossas dores e as levou sobre si.

III. Quando Deus diz “não”

O texto de Lucas segue com o evangelista nos apresentando Jesus em agonia (v. 44). Isso pode apontar para o fato de que Jesus estava implorando para que o sofrimento não viesse, e estivesse ali mesmo recebendo respostas negativas da parte do Pai.

Quantas não são as vezes que passamos exatamente pelo mesmo? Quantas não são as vezes em que oramos por cura, livramento, portas de emprego, etc.? E quantas não são as vezes em que nada disso vem, e é como se Deus não estivesse atento para a nossa aflição? Muitas seria a resposta mais comum. De fato parece que Deus não se importa com nosso sofrimento. Mas, será que é assim mesmo?

Jesus orou pedindo livramento, levando a Deus suas petições e lançando sobre Ele sua ansiedade, e mesmo assim recebeu o temido “não” do Pai, mas por quê? A resposta está no v. 42: “Contudo, não se faça a minha vontade, e sim a tua.”. No fim das contas toda boa oração deve almejar a glória de Deus.

Tiago nos ensina que orações que buscam a glória do homem não atendidas, de modo que podemos pedir coisas a Deus, mas sabendo porém que se nossos planos não o glorificarem, estes não serão atendidos. Era então necessário que a oração de Jesus fosse negada, pois ele deveria ir para a cruz, ser punido em nosso lugar, e assim nos salvar. Vemos como até na negação da oração de um, Deus pode abençoar a muitos.

Mas o exemplo de Jesus também nos ensina que devemos orar quando a dor vem, mas devemos estar preparados para aceitar a vontade de Deus, mesmo que esta seja a dita dor. Enfim, que você possa se apegar a Cristo, que em tudo foi tentado e venceu, e até teve sua suplica sincera negada, mas ainda assim foi vitorioso.

E mesmo que pareça que Deus te negue um pedido agora, Cristo nos ensina a continuar pedindo, não desista se acaso hoje Deus diz não, pois amanhã ele pode te dizer sim, enquanto isso humilhe-se “debaixo da poderosa mão de Deus, para que ele, em tempo oportuno, os exalte.” (1 Pe 5:6).